Homenagem à
A Carlos Drummond de Andrade
Adentra o reino das palavras
Com bocas, olhos e ouvidos atentos,
Colha o verso maduro no minuto que passa.
Teça a fábula invisível com palavras sonhadas
Detenha-se no ruído que cai do silêncio
Venha cerzir como ourives o fio da palavra
Antes da solvência do matiz dourado
Deixe ser a poesia o
Acontecimento lírico
Que se explode em verso
No badalar do meio-dia
Cante coisas miúdas
Todos os dias…
Tudo é motivo de poesia
O corpo vestido de sentimentos
A cidade lá adiante
grande ou pequena,
Ruas latejantes
A paisagem da janela
O segredo das safiras
Cante o sabor das palavras
No brilho das pitangas
Na mordida suculenta
Das jabuticabas.
Cante amoras, hibiscos e libélulas
São um só, o homem e o arco-íris.
Sujeito e objeto já não existem.
Cante o tempo em ciranda
De mãos-dadas
O passado e o futuro,
o depois e o antes
Com o presente no meio.
Tempos meninos
Brincando de roda
Cante a lua ainda
Com suas faces
Fabricando na noite
a luz ou a escuridão
Não haverá iate.
Não haverão jóias ou mansões
que não sejam de sentido
A pérola continua
A ser a palavra
Nos estojos infinitos
Do tempo.
Cante a infância
Não a do espelho
Ou do espectro
Mas aquela
Da memória
No seus melhores dias.
Tudo será ver – dade
Não há porque mentir.
Colha uma folha seca no chão
E isso será um poema.
Viva o poema
Vive o poema
Convive com os teus poemas
Fazendo-os nascer e crescer
De um livro a outro.
Que seja tudo, até do nada.
Toda poesia de toda coisa!
Do que nenhuma poesia sobre nada.
Colha o brilho
Das palavras
No traço do grafite
A chave está na porta
Nem pergunte!
As mil face secretas se abrirão em
salões de mistério…
A melodia jamais cessará
O conceito é trânsito
As palavras agora,
acordadas do sono
e da solidão
Tem cores vivas
Como peixes nos
Cristais d’água
As palavras da água
Seguem seu curso
De linguagem
Na boca de quem
Poesia e profere
Um rio verbal
Que se transforma
Em surpresa.